Ricardo José Lopes trabalhava no mundo da publicidade mas foi fora do escritório que descobriu a sua paixão: levar boa música a um público sedento de qualidade. O criador das Lx Jazz Sessions garante: o jazz em Portugal está bem entregue e não fica atrás de nenhuma grande capital mundial. Autor: Inês Rocha As Jazz Sessions regressaram em força a Lisboa este Verão, nove anos depois das "Lux Jazz Sessions", que transformaram as quartas-feiras lisboetas em 2007 e terminaram, no fim desse ano, com um memorável concerto do Bernardo Sassetti Trio. Estas “sessões de jazz” nasceram em Leiria em 2003, viajaram para o bar Bicaense, em Lisboa, cresceram na mais conceituada discoteca da capital e regressaram este Verão à Bica. Tudo pela mão de Ricardo José Lopes, publicitário leiriense de 38 anos que descobriu a sua vocação na organização de eventos "difíceis". Entre Julho e Setembro deste ano, 13 artistas portugueses subiram ao palco do bar Bicaense, todas as quartas-feiras [ver galeria de fotos / ouvir os áudios]. Ricardo quis fugir dos dias em que toda a gente está na rua. "Gosto de trabalhar dias difíceis", explica, em entrevista à Academia de Guitarra. "É onde o público é atento e sai para ir à procura de algo". Apesar do regresso ao espaço onde começaram as Lisboa Jazz Sessions, em 2005, Ricardo não quis um regresso ao passado. Este ciclo de concertos “é uma coisa nova”, garante. O criador do evento quis “ir buscar o mais fresco do jazz em Portugal”. Não só as novas promessas, mas também os artistas mais conceituados do género. A programação abrangeu músicos diversos, desde Ricardo Toscano, um dos maiores talentos jovens do jazz em Portugal, ao trio Lokomotiv, de Carlos Barreto, o mais antigo no activo, com 20 anos de carreira. Ainda assim, “a música deles é 2016, não é 2006”, garante o produtor. O denominador comum é a qualidade. “Uma das máximas que seguimos na CoolTrain é que os nossos projectos têm que ser bons aqui como no Japão”, conta o organizador. “Aquilo que fazemos tem que ter qualidade tal que qualquer cultura, quando chega, diz 'consigo perceber, interagir e sentir'. Tem que ser uma experiência que podia estar em qualquer parte do mundo". Ricardo escolheu os artistas a dedo e não duvida: os nossos músicos “são bons aqui como no Japão”. “É uma programação excelente”, declara, sem falsas modéstias. Nesta edição, o organizador quis ainda juntar novas camadas ao projecto, convidando o pintor Francisco Vidal para ilustrar as brochuras do evento. Nas suas Jazz Sessions, Ricardo José Lopes pagou todo o evento com patrocínios de marcas. Trabalhar de graça está fora de questão, garante. “As pessoas esquecem se que um músico ou um técnico passaram anos em formação, continuam em formação e trabalham horas a fio que não são remuneradas para chegar àquela qualidade que nós tanto apreciamos”, explica. Nas suas Jazz Sessions, Ricardo José Lopes pagou todo o evento com patrocínios de marcas. Trabalhar de graça está fora de questão, garante. “As pessoas esquecem se que um músico ou um técnico passaram anos em formação, continuam em formação e trabalham horas a fio que não são remuneradas para chegar àquela qualidade que nós tanto apreciamos”, explica. “A cultura e educação têm de ser para todos”, remata. "O jazz abriu horizontes em Leiria"A história das Lx Jazz Sessions começa em Leiria, em 2003. Numa altura em que aquela pequena cidade estava adormecida em termos culturais e organizar concertos ao Domingo à noite soava a loucura. "Toda a gente dizia: como é que vais fazer jazz a um domingo à noite, numa cidade onde as pessoas não saem?", recorda Ricardo José Lopes. O publicitário leiriense estava já envolvido, na altura, nos bastidores da CoolTrain, um colectivo de DJ's pioneiro do drum & bass em Portugal. Em conjunto com o DJ Johnny, com quem partilhava a paixão pelo jazz, decidiu lançar as Leiria Jazz Sessions. O objectivo era dar à cidade onde cresceu e viveu até aos 18 anos um "ímpeto mais cultural". Ricardo acreditava que podia haver público para aquele tipo de iniciativas. "Estava convencido que, se houvesse mais estímulos culturais, as pessoas aderiam. As pessoas querem isso e não têm", afirma, em conversa com a Academia de Guitarra. Durante dois anos, as Leiria Jazz Sessions abriram os horizontes da cidade. Ao contrário do esperado, o espaço escolhido, com 170 lugares sentados, esteve sempre cheio. Ricardo recorda com orgulho este pequeno "milagre" que fez muita gente descobrir a paixão por este estilo musical, incluindo miúdos que tinham as suas bandas de rock e que iam assistir aos concertos, são hoje músicos de jazz. "As sessions ajudaram na orientação, no gosto, na exigência, ajudou-os a perceber o nível de músicos que têm que ser para serem notados", recorda. O “milagre” da triplicação de públicoEm 2005, Ricardo trouxe o evento para Lisboa. Começou no Bicaense, no tradicional Bairro da Bica. O sucesso, conta, foi “gigantesco”. “Havia um mar de gente que ia não só pela música mas pela experiência de estar no 'hotspot' da comunidade criativa lisboeta”. Havia video jamming e “dance floor”, onde o púbico podia dançar jazz. Um fenómeno que chamou à atenção dos responsáveis pelo Lux. A mais conceituada discoteca da cidade quis abrir portas a um público diferente do habitual, e convidou Ricardo para organizar um evento de jazz à quarta-feira. A dimensão do espaço pedia algo mais arrojado. “Os patrocínios permitiram-nos ter dimensão, o dinheiro foi investido em qualidade”, lembra o publicitário. Além de ter trazido grandes nomes do jazz a Portugal, arriscou no conceito. Pôs um palco no centro da discoteca, com os músicos virados para si mesmos, com o público à volta e projecção de vídeo a envolver o público. “A experiência era sensorial”, recorda. Nessa altura, quando estava a preparar e a vender o evento a possíveis patrocinadores, a CoolTrain propôs-se ter uma média de 300 pessoas em cada evento. “No final, quando fizemos as contas, percebemos que tivemos uma média de mais de 930 pessoas”. Este “milagre” da triplicação de público só tem uma explicação, no ponto de vista deste publicitário: “Os milagres acontecem, e acontecem porque as pessoas estão sedentas de qualidade”. Porquê nove anos depois?“Apeteceu-me”, diz Ricardo José Lopes. O responsável da Cool Train confessa que estas coisas “têm muito a ver com o 'apetece'”. A exigência do projecto “Lux Jazz Sessions” levou Ricardo aos seus limites físicos. “Em seis meses, tive três Domingos de folga. Trabalhava 12 a 16 horas por dia”, recorda. Depois da necessária pausa, decidiu fazer também deixar por uns tempos o seu trabalho principal, a publicidade, para viajar pelo mundo. Partiu em 2010 e só regressou dois anos depois. Uma experiência que o mudou e o tornou “mais humilde”, conta. Lx Jazz Sessions no Bicaense. Fotos de Pedro Gomes Almeida O regresso das Jazz Sessions vem a seguir ao Fado Redux, que organizou no Bicaense de Outubro de 2015 até Maio deste ano, a convite do proprietário. Para o futuro, quer que o evento de jazz dê o salto para um espaço maior. Está a preparar um novo ciclo para Outubro, Novembro e Dezembro do próximo ano, “com uma dimensão mais próxima do Lux”. Este ano fez Ricardo compreender que “é este o caminho” que quer seguir. Hoje, ocupa menos tempo na publicidade e mais nestes projectos. “É um caminho que tenho que perceber como expandir”, diz.
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